segunda-feira, 10 de novembro de 2014

Calisto , Amélia e o JEC

São Luís , 4 de novembro de 2014 , 23:45 hs.........naquele exato momento , após jogar como se estivesse na Arena Joinville , o Joinville Esporte Clube , o popular JEC , derrotava o Sampaio Corrêa local por 2 a 1 e  retornava à primeira divisão do Campeonato Brasileiro depois de quase 30 longos anos !( a última participação havia sido em 1987 , quando o campeonato foi dividido em grupo dos grandes , ou MÓDULO VERDE , e grupo dos pequenos , ou MÓDULO AMARELO ) . Além da imensa alegria pelo retorno do JEC ao convívio dos grandes  , na cabeça dos torcedores mais velhos com certeza naquela instante passou um filme na cabeça ..........Surgido em 1976 , como fruto da fusão entre dois clubes tradicionais mas que já não tinham mais condições de se manter na futebol profissional - América e Caxias - para surpresa e alegria geral , naquele mesmo ano o JEC conquistava seu primeiro título estadual , derrotando o hoje extinto Juventus de Rio do Sul na grande final . Pouco tempo depois , em 1978 , teria início uma fantástica sequência de 8 títulos estaduais consecutivos , que só terminou em 11 de dezembro de 1985 , quando o JEC derrotou , de maneira categórica  , o Avaí por 2 a 0 . Em 1987 viria aquele que foi o título que encerrou a fase de ouro do JEC...... com uma atuação de gala , especialmente do jogador NARDELA , o JEC derrotava o arqui rival Criciúma por 2 a 0 , em pleno estádio Heriberto Hulse . Após longo período sem títulos , numa chuvosa tarde de 18 de junho de 2000 no estádio Ernestão , o JEC derrotava o Marcílio Dias de Itajaí por 2 a 1 na grande final , com um gol e em um momento em que o adversário jogava melhor e estava muito próximo do gol que lhe daria o título . Em 2001 veio o bicampeonato , com oura vitória categórica sobre o Criciúma por 2 a 0 e de novo no Heriberto Hulse . Os bons tempos pareciam ter voltado , apenas pareciam.......

 Derrotas vergonhosas para adversários inexpressivos , derrotas traumáticas em jogos importantes e decisões , péssimas administrações , times medíocres , dois anos sem disputar qualquer competição nacional ( 2008 e 2009 ) , rebaixamentos e até mesmo  uma vergonhosa tentativa de compra de vaga na série C de 2008 pelo então prefeito MARCO TEBALDI ............Essa foi a triste rotina do JEC  a partir de 2002 e a decadência e o apequenamento pareciam inevitáveis . O reerguimento do JEC começou de maneira discreta no fim de 2009 , coma conquista da pouco expressiva Copa Santa Catarina , o que lhe valeu a vaga na série D do Campeonato Brasileiro de 2010 . O acesso à série C só veio graças à escalação irregular de um jogador do América de Manaus , adversário que o havia eliminado da competição e se havia alguma dívida , ela foi paga com juros e correção monetária na ensolarada tarde de 3 de dezembro de 2011  quando o JEC , para a imensa alegria e delírio de sua apaixonada torcida , conquistava o título da série C , derrotando o CRB alagoano por 4 a 0  na Arena Joinville . O JEC é tão identificado com a cidade , que até a década de 90 o seu hino era o mesmo  da cidade e talvez seja um dos únicos casos de mobilização popular da história de Joinville junto como Corpo de Bombeiros Voluntários e o Festival de Dança . A crônica de hoje é uma homenagem do escritor JURA ARRUDA neste retorno do JEC ao seleto grupo dos grandes clubes do futebol brasileiro . CONFIRA :

"Calisto e Amélia têm sorte no jogo e no amor , e ao mesmo tempo . Ele caxiense , ela americana , uniram-se em 1976 no matrimônio e na torcida . No sábado casaram-se na Igreja do Sagrado Coração de Jesus ; na terça-feira seguinte , aniversário da cidade , estavam na outra esquina , com ingressos na mão para a primeira partida do clube que uniria de vez seus corações .



O Ernestão (FOTO ABAIXO ) virou segunda casa . Deles e dos filhos .



 O neto , Reinaldo , que nasceu em 1999 , nunca torceu para um time de série A .....até então .

 É uma história de amor ! O casamento do joinvilense com o time uniu em matrimônio duradouro a cidade , de Norte ( América - ABAIXO , FOTO DO AMÉRICA DE 1973 )



a Sul ( Caxias - ABAIXO FOTO DO CAXIAS DE 1971  ) .



 O time que nasceu campeão , como diz seu hino e como conta a história , nasceu também com a maior torcida do Estado . Com vocações , portanto , para o jogo e para o amor . Um amor que sustentou o relacionamento,  mesmo nos tempos de crise .

 É preciso dizer também que a lua de mel entre torcida e Joinville Esporte Clube foia mais longa da história . Durou mais de dez anos , o time dava uma atrás da outra conquista para seus torcedores , num gozo espetacular de felicidade e orgulho . Eram também os tempos de série A , o time encarava de igual para igual , ou com superioridade , times poderosos como São Paulo , Flamengo , Santos ( ABAIXO , VITÓRIA DE 2 A 0 SOBRE O SANTOS , EM ABRIL DE 1980 )



 e Corinthians . Eram tempos de Paulo Egídio , Geraldo Pereira , Adilço , Alfinete , João Carlos Maringá e um tal Reinaldo . Reinaldo como o neto de Calisto e Amélia , mas que ficou conhecido como Nardela  . ( ABAIXO , DE CABEÇA ENFAIXADA , EM FINAL CONTRA O CRICIÚMA , EM  1987 )



 Reinaldo , o neto  vai prestar vestibular mês que vem , quer subir na vida , quer ser alguém , quer cruzar o país do Sul ao Norte e vencer , como o seu JEC . ( ABAIXO , TIME CAMPEÃO DA SÉRIE C , EM 2011 )



Quer fazer parte da elite , quer estar no topo e jogar esse jogo da vida , que nos desfia o tempo todo , que nos impõe dificuldades e derrotas , mas que nos oferece momentos de felicidade e glória . É preciso se prepara muito bem , porque se manter na elite é ainda muito mais difícil do que chegar à ela . Muitos dos joinvilenses nascidos depois da  década de 80 vão viver a experiência da série A pela primeira vez . Calisto e Amélia , que já conheceram o gostinho , preparam a garganta para 2015 . "


quinta-feira, 30 de janeiro de 2014

http://www1.an.com.br/1999/dez/26/0ane.htm

O século da decolagem
Em ensaio bem humorado sobre o século 20, autor ironiza a aventura humana de voar
Milton Wendel
Especial para o Anexo
O século 20 foi o século em que o homo sapiens conseguiu desatar o nó da atração gravitacional da boa e velha Terra e começou a navegar, meio desajeitado, pelo universo próximo. Alguns corrigem esta frase com a observação de que o homem não "começou" a navegar pelo cosmos, mas sim "voltou" a trilhar o caminho pelo qual veio até aqui. Outros asseguram que a expressão "universo próximo" é um exagero porque, diante dos 4,3 anos-luz que nos separam da Próxima Centauri e dos 100 mil anos-luz que a galáxia tem de diâmetro, a ida à Lua não passa de uma caminhada pela vizinhança da toca. Quanto a "desatar o nó", convenhamos que o que ele fez foi meter o machado na corda.
De qualquer modo, foi no século 20 que a decolagem aconteceu. Caso advenham outros séculos, este nosso terá como símbolo a ignição pirotécnica do foguete, a singela constatação de Gagárin de que a Terra é azul e a pegada da bota de Armstrong no chão de Serenitatis. Em todas as escolas da galáxia haverá sempre um professor fascinado pelo século 20, assim como nas escolas de hoje há sempre um fascinado pelo Renascimento, pela tectônica das placas, pela literatura italiana. Os entusiastas do Vintão Maravilha dirão que fomos fabulosos, que conseguimos em 30 anos o que era inimaginável nos 30 mil anos precedentes.
Mas é bem possível que alguns professores, não muito entusiasmados, ou talvez herdeiros de nossa própria percepção fantasiosa do passado, descrevam a decolagem assim:
"Um deles, doutrinado e bem tratado, sentava-se na ponta de um tubo cheio de explosivo, enquanto outro, no chão, ateava fogo a um rastilho. A coisa explodia e o jato, direcionado para baixo, propulsionava a engenhoca para cima, por reação. Embora espantosamente rudimentar, geralmente funcionava".
Fantasioso ou caricatural? Os sujeitos que, no chão, ateiam fogo ao rastilho serão considerados sacerdotes, conhecedores dos mistérios da técnica. Afinal, é preciso muita autoridade para detonar uma bomba sobre a qual um semelhante está sentado e mandá-lo para o espaço sem garantias de que ele retorne vivo. Se na aldeia gaulesa do Asterix, o herói francês, alguém arriscasse uma experiência desse tipo, Goscinny e Uderzo escolheriam para sentar na ponta do tubo, certamente, o insuportável bardo Chatotorix. Talvez os historiadores do futuro jamais entendam a razão pela qual os astronautas do século 20 fossem escolhidos entre os indivíduos mais aptos física e mentalmente. Afinal, as marinhas de guerra não selecionam aqueles a quem dá a tranqüila e segura tarefa de esfregar conveses e descascar batatas. Será que buscamos, no espaço, o mesmo que os cavaleiros cruzados da Idade Média buscavam na matança em nome da fé?

Circo para entreter massas entediadas
Haverá um dia em que as naves com as quais o homem se lançou ao espaço, no século 20, serão vistas tal como hoje vemos as caravelas de Colombo ou de Cabral, ou talvez nem isso. A tecnologia utilizada ­ hidrogênio líquido, titânio e giroscópio ­ não excede muito aquilo que o homem já conhecia no tempo do porrete e da carroça: pólvora, bronze e roda.
Então por que o homo sapiens, que estava tão feliz juntando todo o dinheiro que a mais-valia poderia proporcionar, virou-se subitamente ao céu ­ que até então era do interesse dos poetas e dos meigos ­ e pagou uns rapazes para que subissem lá em colunas de fogo e de luz? Ameaça iminente de catástrofe? Não. Precauções com a superpopulação? Claro que não, pois população é mercado e mercado é money. Busca de riquezas? Impossível, pois as naves não possuíam bagageiro.
Como será que os estudiosos do futuro interpretarão o ânimo coletivo, o contexto psicológico, da decolagem do século 20 rumo ao cosmos?
"Foi tudo circo para entreter as massas entediadas", declara Charles Chaplin, brandindo em uma mão a bengala da humildade e na outra a lanterna de Diógenes.
"Tolice", intervém Henry Kissinger, limpando a narina com o dedo indicador, formando uma garra com o polegar, "pois as massas já estavam suficientemente distraídas assistindo ao futebol. A Copa do Mundo tem a idade exata da corrida espacial e a bola é mais popular do que a Lua".
Aldous Huxley tentou dizer que era tudo conseqüência das vontades profundas e insondáveis do Grande Irmão, mas foi impedido por um sujeito com enormes orelhas de abano, que puxou o franzino Huxley para trás e encarou o secretário de Estado: "Cale a boca, seu contrabandista de latrinas de campanha", disse o orelhudo. Era John Steinbeck. Esmagava, contraindo o punho, um cacho de uvas da Califórnia. Ele estivera escrevendo com o vinho que lhe escorria pelo braço.
­ Enquanto nos arrastávamos pela 66 com aquele Dodge velho que nos custou nossos animais, nossas lavouras e nossas dignidades, quando fomos excluídos quase ao ponto do canibalismo, sua escola aperfeiçoava o modelo que engorda ratos às custas do sangue dos americanos bons e honestos. Os fabricantes de satélites de espionagem ficavam ricos enquanto nós tínhamos que rastejar em busca de um buraco que nos protegesse do frio. Tudo para nos esconder o fato de que os soviéticos estavam na frente.
"Concordo", disse Lênin. "O modelo produtivista-consumista não tem limites éticos. Ele comercializa até mesmo seu anacronismo e suas imperfeições, com o que gera mais anacronismo e mais imperfeições. Não desejei que a liderança soviética, a liderança do proletariado (sorriu, com uma sombra de cinismo) vos causasse desconforto e contratempos. Mas deveis admitir que a corrida alimentou vosso modelo, ocupou vossas linhas de produção. E isto se traduz no que vós chameis de lucro. Não é assim?"
"Eu discordo", disse Krupp, o magnata alemão dos canhões. "Porque naves espaciais são mercadorias complexas. Exigem noventa e nove partes de cálculo e raciocínio e apenas uma parte de manufatura e produção. Se eu me metesse a construir naves espaciais, ao invés de canhões, eu jamais teria ficado rico. Eu nunca fabricaria naves espaciais".
"Ainda bem", disse Werner von Braun, o deus da chuva de bombas V. "Porque com a sua tecnologia tudo que teríamos conseguido seria um homem-bala de circo."
"E com a sua, tudo que podemos almejar é um piquenique ali na Lua e nada mais", interveio Albert Einstein, mostrando a língua. "Se me convidarem para um destes piqueniques eu explicarei algumas coisas básicas que vão abrir suas cabeças para a compreensão da grande viagem, e não de simples piqueniques. Não que eu não goste de piqueniques..."
­ Agrada ver que anda pensando em piqueniques, e já não tanto em bombas atômicas, cavalheiro Einstein.
Era o imperador Hirohito censurando o pai da relatividade com olhos frios e penetrantes. Leonid Brejnev pediu a palavra:
­ A respeito disso de lançar bombas sobre populações civis, quero declarar que jamais fizemos detonações atômicas com qualquer outro fim que não fosse científico e humanitário.
Houve risos esparsos. Soljenítsin e seus dois guarda-costas da Cia caíram na gargalhada. "Nunca deflagramos um mísero megaton em operações de defesa", continuou Brejnev. "E comemoram este mérito lançando sobre a Terra uma chuva de satélites desgovernados recheados de plutônio", emendou um militante do Greenpeace, aplaudido por Jane Fonda.
­ Devagar aí seu menino, seu messias de brinquinho.
Era um homem atlético, calvo, e usava um ray-ban. "Os donativos em dinheiro que a sua organização recebe no mundo inteiro são depositados em contas bancárias. As transferências são feitas por satélite. Eu já levei vários desses satélites lá para cima. Mês passado levei um que tinha uma pilha de plutônio que era isso" ­ o comandante dispôs as mãos diante do peito de modo que entre elas caberia um coco. "E todo mês levamos mais um. E eu sei que mais cedo ou mais tarde este lixo todo vai cair de volta. O que lhe pergunto, caro ambientalista, é: você vai continuar usando os serviços bancários?"
Não houve resposta porque, no fundo do auditório, alguém gritou com um vozeirão:
­ Se estão jogando lixo sobre suas próprias cabeças por que não param com isso?
Era um tipo imundo, vestido com uma manta esfarrapada. "Parar?", murmuraram todos juntos.
­ Sim. Parem. Se é inútil, polui e destrói, então parem.
A platéia caiu sobre o maltrapilho com uma vaia animalesca. Voaram sobre ele pastas, celulares, pagers, medalhas de general, de brigadeiro, de almirante, comendas das mais variadas ordens, prêmios Nobel, diplomas, certificados, rolos de macarrão e chaves de fenda. Charles Chaplin caminhou por entre a multidão alvoroçada escapando em ziguezague dos cotovelos errantes e dos objetos voadores. Defendia-se com a bengala formando um escudo patético. Chegou ao maltrapilho e estendeu-lhe a lanterna:
­ Tá.
O alvoroço foi aquietando. Quando o silêncio tornou-se absoluto, o maltrapilho perguntou a Carlitos:
­ Tem algum?
Carlitos deu de ombros e ficou encolhido, com a cabeça baixa. "Mas nenhum?", insistiu Diógenes. Carlitos encolheu-se mais. Diógenes deu meia volta e saiu. Carlitos acompanhou-o pela porta, quatro passos atrás, e sentou-se na escadaria do templo enquanto via o maltrapilho Diógenes afastar-se pela rua com a lanterna de procurar consciências (ou "homens honestos", como nos ensinam no primário). Uma cadelinha aproximou-se de Carlitos, sentou-se ao seu lado, de encontro ao seu quadril, e deitou o focinho sobre sua perna. Carlitos afagou-a. Ela chamava-se Crespinha, e nos jornais ficou conhecida por Laika, a cadelinha-cobaia que morreu em 13 de novembro de 1957 a bordo do satélite soviético Sputnik 2, após estar dez dias em órbita. (MW)